Era sábado de Carnaval. O ônibus levava 42 pessoas, entre elas, muitas crianças. O destino final era Salvador. O veículo da empresa Viação Itapemirim havia saído de Fortaleza e percorrido cerca de 450 quilômetros em direção à capital baiana quando, em uma curva na BR-116, saiu da pista e caiu no açude Cipó, no município de Barro, no Ceará. Todos os passageiros morreram.
A tragédia completou 20 anos na última quarta-feira e segue viva no coração de muitos cearenses. "[Muita gente] acende velas, aí tem épocas que passam familiares aqui na estrada, param, fazem a parte deles, oram. A gente quando passa por aqui também faz a nossa parte, porque a gente é humano", conta o agricultor Francisco Saraiva, que acompanhou o acidente na época.
Até hoje, o acidente está repleto de perguntas sem respostas. Não se sabe exatamente o que causou a fatalidade - se erro humano, se falha mecânica. O veículo fazia o trajeto para Salvador atravessando o interior cearense, para depois cruzar o interior pernambucano e entrar no norte da Bahia.
O acidente ocorreu por volta de 4h30. O ônibus já estava em Barro, na região do Cariri, área que faz divisa com os estados do Rio Grande do Norte e de Pernambuco, a três cidades de deixar o território cearense. Segundo testemunhas, o coletivo saiu da pista na BR-116 e afundou no açude.
Acidente de ônibus em Barro (CE), em 2004, deixou 42 mortos — Foto: TV Verdes Mares
"Foi um momento muito triste, muito difícil", relembra o comerciante Marcos Trigueiro, que tinha 21 anos na época.
"A gente veio aqui [no açude Cipó] por um amigo que é feirante e vinha atrás do ônibus. Ele identificou que ele caiu dentro desse açude, mas até então ninguém tinha certeza. A gente foi atrás da polícia, viemos para cá, mas ninguém via nada. A polícia foi quem chamou o Corpo de Bombeiros", diz Marcos.
"Aquele dia foi um dia muito triste pra gente, nós fomos acionados pelo Ciops para um possível afogamento, um afogamento de várias pessoas naquele ônibus da Itapemirim. A minha guarnição foi a primeira a chegar no local, na época eu era capitão, comandava a guarnição dos bombeiros de Iguatu, e ao chegar no local a gente não se deparou com absolutamente nada, ou seja, o ônibus estava completamente submerso", conta o tenente-coronel Valdyano Rodrigues, comandante do 5º Batalhão de Bombeiros do Cariri.
Entre os mortos no acidente de ônibus estavam crianças e mulheres — Foto: TV Verdes Mares
Segundo o militar, foi somente após os bombeiros realizarem os primeiros mergulhos que, finalmente, constataram que um ônibus havia afundado e, com ele, dezenas de pessoas tinham morrido afogado.
A maioria dos passageiros era homens, mas havia mulheres e crianças. Todas as janelas estavam lacradas no momento da queda, provavelmente por conta do ar-condicionado.
No início, de acordo com Valdyano Rodrigues, ainda havia expectativa de encontrar sobreviventes. Mas tão logo o resgate prosseguiu, as esperanças foram deixadas de lado.
A operação de resgate durou dois dias, período no qual a BR-116 ficou interditada no município. Equipes de bombeiros de outras cidades, como Fortaleza, Crato e Juazeiro do Norte, foram enviados para ajudar nas buscas.
Operação de resgate dos mortos em acidente em Barro (CE) durou 48 horas — Foto: TV Verdes Mares
"O que mais chocou foi porque a gente não imaginava que tinha naquele ônibus tanta gente. E falando da operação em si, o que chocou tanto a gente também é que tinha criança, a gente resgatou pessoas onde estavam agarrados com seus filhos, seus entes queridos na possibilidade de salvar", recorda o tenente-coronel dos bombeiros.
Na época, a prefeitura de Barro declarou luto oficial de três dias. A festa de Carnaval do município foi cancelada, e o clima de luto tomou a região. Um pequeno memorial foi construído próximo ao açude. Hoje, a construção está deteriorada, mas ainda recebe homenagens de parentes e amigos das vítimas.
Para os bombeiros que participaram do resgate, a lembrança do acidente também permanece viva. "Uma memória bastante triste, até mesmo porque o nosso objetivo de bombeiros é salvar vidas e não resgatar vidas. A gente se sente feliz ao salvar vidas e não em resgatar corpos", lamenta Valdyano Rodrigues.
À esquerda, memorial erguido às vítimas do acidente, hoje deteriorado. À direita, o açude Cipó, onde o ônibus caiu — Foto: Edison Freitas/TVM
Fonte: g1 CE